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Você assistiu a muitos filmes de
Hollywood e acreditou que beber e fumar te deixaria mais sexy, porque os
personagens fazem isso o tempo todo e recebem uma atenção significativa das
mulheres. Então, você vai lá: bebe e fuma. Repete a equação algumas vezes, mas sem
resultado algum. Até o momento em que – eu estou resumindo a história – você
senta sozinho em um bar. E essa triste cena se repete também. Pois o mais
triste seria ficar em casa – ainda mais depois que você entregou os gatos para
adoção e cancelou a TV por assinatura – quase todos os canais eram de culinária.
Um dia, uma mulher se aproxima e pergunta se você tem fogo. Sim, lógico que
você tem. Você faz um gesto ágil em seu Zippo falsificado e uma labareda surge
e ilumina por pouco tempo o lugar. Depois, ela lhe pede uma bebida. É tudo
muito estranho. Isso raramente aconteceu, pois você não está em Hollywood. Você
já bebeu e fumou o suficiente para não cair nesse truque. Você está mais gordo
e com uma péssima dentição. Sua pele não está boa. Só em Hollywood que os homens
pisam fundo e ainda mantém os braços musculosos e barriga em dia. Você retorna
a mulher. Não prestou atenção em quase nada do que ela falou. Algumas palavras
soltas, apenas. Cocaína, meu ex-marido, meu filho está com minha mãe, essa
cidade é uma merda... Você só balança a cabeça, dá umas bicadas em seu copo, dobra
as sobrancelhas ou oferece sorrisos curtos. Se fosse em Hollywood, ela seria
uma espécie de modelo fracassada e você aparentemente teria sorte em
encontrá-la. Mas seria só uma isca. Depois das primeiras noites tórridas de
sexo – em Hollywood o sexo é sempre quente –, vocês viveriam em guerra. Ela
teria outros. Você, outras. Os dois teriam ciúmes. Seria uma barra, seria
doentio. O final do filme seria uma fuga, deixando pequenos delitos ou crimes
para trás. Você guardaria umas novas cicatrizes, que só trariam orgulho pra
você – nem cicatrizes de guerra são mais motivo de orgulho, as de briga
então... Ela, a personagem secundária, seguiria do ponto onde lhe encontrou. E,
certamente, outro a acolheria. A resposta para tudo isso, ou a moral, pouco
importaria. Seria só uma breve história sem redenção alguma. Uma parábola onde os
personagens se ferem por serem solitários e não encontrarem respostas. Afinal,
quem tem pretensão em tê-las? Você acorda do transe que foi assistir a esse “filme
b” e ri de toda essa bobagem. Ela, que estava falando sobre como as crianças
sabem ser cruéis, usando como exemplo seu filho de cinco anos que a chamou de
puta na frente de toda a família em uma noite Natal, se surpreende com sua
alegria repentina. Você se desculpa e diz que pensou numa besteira, numa piada.
Ela quer saber o que é. Diz que ficou muito curiosa e também quer rir. Você pergunta
se ela não quer seguir a conversa na sua casa. Lá você conta o que te fez rir. Ela
aceita o convite. Fala que está ansiosa para ouvir a tal piada. Na verdade, você não
sabe contar uma sequer, mas tem noites que vale a pena arriscar.
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