Eu deixaria aqui tudo, os vales, as colinas, as trilhas e as pegas do jardim, eu aqui deixaria o vinho e a fé, o céu e a terra, a primavera e o outono, aqui deixaria os caminhos que partem, as noites na cozinha, o derradeiro olhar de amor e todos os imperativos terríveis que conduzem às cidades, aqui deixaria o crepúsculo denso que se assenta sobre a paisagem, o peso, a esperança, o encantamento e a serenidade, aqui deixaria o que é amado e o que é próximo, tudo que me emocionou, tudo que me abalou, que me fascinou e me ergueu, aqui deixaria o nobre, o bem-intencionado, o agradável, o diabolicamente belo, aqui deixaria os brotos fenecentes, todo nascimento e existência, aqui deixaria a magia, o mistério, a distância, o inextinguível e a narcose das verdades eternas: porque aqui deixaria essa Terra e essas estrelas, porque não levaria nada daqui comigo, porque espreitei o que virá, e daqui não preciso de nada.
László Krasznahorkai, “Daqui, eu não preciso de nada”, Anuário Todavia 2018/2019. Tradução de Paulo Sc
Nenhum comentário:
Postar um comentário