sexta-feira, 21 de abril de 2017

Dois Galãs - Conto de James Joyce


James Joyce, no centro da foto


Dois trechos do conto Dois Galãs, do livro Dublinenses (edição de 1993, editora Siciliano), de James Joyce.


Caminhou a esmo por Stephen’s Green e desceu a Grafton Street. Embora seus olhos captassem uma série de detalhes da multidão a sua volta, a observação era feita de uma maneira morosa. Achava banal tudo o que supostamente deveria agradá-lo e não correspondia aos olhares convidativos que o cercavam. Sabia que teria de falar muito, inventar histórias e fazer graça, mas tanto o seu cérebro quanto a garganta estavam secos demais para realizar tal proeza. A questão de como passar o tempo até chegar a hora de encontrar-se com Corley preocupava-o um pouco. Não via outra coisa a fazer, a não ser continuar caminhando. Dobrou à esquerda quando chegou na esquina da Rutland Square e sentiu-se mais à vontade na rua escura e quieta, cujo aspecto soturno veio a calhar com seu estado de espírito. 

(...)

Estava cansado de dar cabeçadas, de fazer das tripas coração, de artimanhas e intrigas. Completaria trinta e um anos de idade em novembro. Será que nunca conseguiria um emprego? Será que nunca teria um lar? Como seria bom poder sentar-se diante de uma lareira e um jantar gostoso. Já perambulara demais pelas ruas com amigos e mulheres. Bem sabia o quanto valia essa gente. Certas experiências haviam tornado seu coração amargo com respeito ao mundo. Mas ainda tinha um pouco de esperança. Sentiu-se melhor depois de comer, menos revoltado com a vida, menos abatido espiritualmente. Quem sabe ainda conseguiria fixar-se em algum lugar agradável e ter um pouco de felicidade; tudo que precisava era encontrar uma garota bobinha e com um pouco de dinheiro.

terça-feira, 18 de abril de 2017

O Tempo do Lobo, Filme de Michael Haneke



Um drama sobre refugiados. Sobre barbárie e esperança. O Tempo do Lobo, filme de 2003, dirigido por Michael Haneke.

Abaixo, a carta que a personagem Ana escreve a seu pai.


Querido papai,

Agora, que encontrei caneta e papel preciso te escrever. Tanta coisa está acontecendo e não há ninguém a quem eu possa falar. Eu não sei se você pode ver, ou ouvir, ou ler isso, ou mesmo se você pode sentir qualquer coisa. Mas quero tanto acreditar que você pode. Meu muito querido papai... É tão difícil colocar isso em palavras quando não há ninguém a quem falar. Parece que estou sufocando. Você poderia perguntar, por que não falo com Benny ou a mãe. Mas eu não posso. Você saberia disso, se estivesse aqui. Tenho de pensar em cada palavra que digo a mamãe, porque senão ela pode ter um colapso. Suas mãos estão sempre tremendo e eu não posso ajudá-la.  Eu não acho que Benny possa entender, como você pode entender, papai. E também tem esse menino. Eu poderia falar com ele. Mas ele age com tanto orgulho e é como se ele não se importasse com nada. Mesmo que eu saiba que não é esse o caso. Deve estar parecendo muito confuso para você. Mas essa é a principal razão porque eu estou escrevendo. Minha esperança é que, por escrito, isso faça sentido. Eu quero contar para você uma coisa, depois outra. De modo que você possa entender a vida que estamos levando. 



quinta-feira, 6 de abril de 2017

Discografia Essencial - Meu Nome é Gileno (1976)


Meu Nome é Gileno - Leno (1976)

Discaço! Não está em nenhuma lista de melhores, não é citado por nenhum especialista como discografia básica. Bom... o problema é deles.


sábado, 1 de abril de 2017

Como Vovó Já Dizia


Eu perguntava como estavam as coisas e minha vó encarreirava problemas e brigas. O vizinho, o amigo, o parente. Um deles tinha lhe aprontado. E ela tinha sempre a razão. Segundo a velha, a atitude certa era sumir. Ir pra bem longe. Tinha certeza que ninguém daria falta.

Eu dizia pra ela não falar bobagem. A velha ia pra cozinha braba. Guardava umas louças, fazia uma bateção desgraçada nos armários e de lá comentava, naquele tom de quem fala sozinho.

- E tem mais. Eu não sou dinheiro pra todo mundo gostar de mim