As canções se vingavam: ele as abandonava repetidamente, mas sempre voltava, sempre retornava a elas. Se antes tratava cada canção como lhe apetecia, só precisando sussurrar algumas frases para fazê-la chorar, agora elas nada sentiam, não eram atingidas por seu toque. Pegar o trompete o deixava sem fôlego para tocá-lo, e cada vez mais ele cantava a letra das canções, com uma voz frágil e suave como o cabelinho de um bebê. Às vezes, acariciava suas velhas canções com tamanha delicadeza que elas se lembravam do que um dia tinham sentido, da facilidade com que haviam sido enobrecidas pelos seus dedos e seu sopro – mas, sobretudo, apiedavam-se dele, ofereciam-lhe uma guarida que ele mal tinha forças para aceitar.
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Trecho do livro Todo Aquele Jazz (Companhia das Letras)
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