Em meados dos anos 90, os pré-adolescentes andavam sozinhos pelas ruas. Percorriam até mesmo longas distâncias. Falo disso, porque eu era um desses.
Foi assim num sábado de manhã. Saí de casa cedo e fui até a parada de ônibus. Aguardava a linha 611 Lindoia. Junto de mim, estava um amigo de infância e seu pai.
A gente se conhecia desde os 9 anos. Tínhamos a mesmo idade. Éramos colegas na Escola Estadual de Ensino Fundamental Ana Neri. Vivíamos no Parque São Sebastião, Zona Norte de Porto Alegre.
Eu morava num daqueles apartamentos, que eram iguais a quase todos os que haviam no bairro. Ele, numa rua que foi fechada por uma cancela, com a intenção de se tornar um condomínio particular, repleto de casas.
Apertamos as mãos.
- E aí, Zetti! - ele disse.
- E aí! - respondi.
E mais não falamos. Seu pai fingiu que não me viu. Entramos no ônibus deserto. Sentamos um em cada banco. Não haviam distrações eletrônicas naquele tempo. Então, fomos admirando a paisagem que corria pela janela.
No Terminal Rui Barbosa, fim da linha, nos despedimos. Entretanto, fomos caminhando nas mesmas ruas do Centro.
- Tá indo pra onde? - perguntei.
- Vamos pegar o ônibus São Caetano, do lado dos Correios - ele disse.
- Eu também!
- Vamos no Hospital Espírita.
- Eu também vou descer ali. Mas vou ver minha vó, que mora perto.
Fomos. O silêncio persistia. Mais um ônibus vazio. Sentamos um em cada banco, outra vez. Seu pai seguia fingindo que não me via. A essa altura, eu já sabia o motivo. O homem era um bêbado inveterado. Percorria todos os botecos da região. Estava indo se internar no tal hospital. Tratar o alcoolismo.
A cena era inusitada. Dois pré-adolescentes cruzando a cidade. Um, levava de arrasto seu pai bêbado. O outro, ia visitar a avó, uma velha solitária e encrenqueira que ninguém queria por perto.
A verdade é que deveríamos estar jogando bola ou assistindo tv, naquela manhã. Como todos nossos amigos estavam fazendo. Porém, optamos por cruzar a cidade de Norte a Sul.
O motivo era simples e complexo. A gente amava demais aquelas duas pessoas extremamente difíceis. E não entendíamos bem o que estava, de fato, acontecendo com eles. Porque não era fácil entender os adultos.
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Imagem extraída do Google Maps. Local é o ponto de parada citado no início do texto.
Nunca foi facil entender os adultos
ResponderExcluirSensacional
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