quarta-feira, 11 de setembro de 2013

A Cena Literária de Porto Alegre

Basta passar os olhos por qualquer premiação literária, que você verá escritores de Porto Alegre: Portugal Telecom, Jabuti, Revista Granta... E em todos os gêneros possíveis. E não são poucos concorrendo! A literatura produzida aqui tem visibilidade, tem infraestrutura, tem público e, obviamente, tem qualidade. Há uma cena cultural autossustentável, com eventos, feiras e cobertura midiática.

Mas também há um perfil comum a maioria desses escritores. O que é curioso em uma capital que se diz, e se vende como, intelectualizada. Uma olhada mais atenta e é possível perceber as peculiaridades de nossos escritores mais conhecidos. Todos os jovens autores, por exemplo, passaram por oficinas literárias (existem aos montes e já se tornaram quase obrigatórias), estas ministradas por escritores mais tarimbados no mercado, como Carpinejar, Assis Brasil, Cintia Moscovich, entre outros. O escritor “recém-formado”, portanto, recebe um carimbo de seu tutor (que também se promove com isso, obviamente), atestando a qualidade e o potencial do pupilo. Em muitos casos, talvez a maioria deles, justificadamente.

As editoras, cientes desta indicação qualificada, publicam as promessas. E assim, nasce um “jovem autor” em Porto Alegre. Terão outras etapas cruciais para o jovem autor se dar bem. Mas, antes, existe um outro fator relevante para compreender esse processo. Os “autores velhos”, os tais tarimbados que ministram oficinas, em sua imensa maioria, estão atrelados ao jornal Zero Hora, que é do Grupo RBS, este afiliado a Rede Globo. E aí está a segunda curiosidade: todos possuem espaços de opinião no principal jornal da cidade, com colunas fixas ou artigos no Segundo Caderno (espaço cultural). Aí, que o círculo se fecha. Um, o jovem, começa com a bênção do outro, o velho, que se mantém vivo na cena porque apresenta seus iniciados ao mundo. E a roda segue girando... No fundo, não há problema algum nisso. Todas as cenas culturais se constroem mais ou menos dessa forma. É o que, popularmente, chamam de “panelinha”, um grupo restrito e formado só por amigos.

O que é preocupante são os outros veículos, os concorrentes da Zero Hora. Estes, de forma bizarra, são pautados pela ZH! É impressionante. Uma ação sem cabimento, nem noção: divulgar, ou reforçar, o que o líder de audiência publica. O resultado é que os autores carimbados que tem espaço na ZH, inevitavelmente, terão repercussão na concorrência. E assim a cena de uma cidade toda se resume aos indicados por um jornal...

Não esquecendo as próprias políticas públicas que, além de serem raras (as verbas para cultura sempre ficam em último plano), também resvalam, incrivelmente, a esse público cativo. Basta verificar as premiações do município e do estado, ambas, em sua maioria, contam com autores que tem grandes editoras e ampla visibilidade nessa tal cena.

Acaba que, ninguém, nessa indústria cultural toda busca a novidade. A exceção são os autores que dão as tais oficinas, pois estes necessitam no sangue novo para viver. A cena, então, apenas se limita ecoar o discurso de um jornal. O resultado disso, é a percepção, principalmente em quem gosta de livros, que os autores ausentes desse processo midiático, não existem. Aquela coisa de buscar o novo, o diferente, o exclusivo, que sempre alimentou os jornalistas e os cadernos culturais, não existe em Porto Alegre. Essa uma triste constatação.